Parte da parceria da SaferNet com a Procuradoria da República no Estado de São Paulo (PR/SP), do Ministério Público Federal, acabou nesta sexta-feira (12). O MPF-SP divulgou uma nota pública, acompanhada de um parecer técnico, na qual a capacidade da ONG para encaminhar as denúncias é considerada insuficiente. Um dos peritos que assinou o parecer técnico é Tiago Bortoletto Vaz, ex-diretor de tecnologia da própria SaferNet.

Valter Campanato/ABrthiagotavares

O presidente da SaferNet, Thiago Tavares, fala em coletiva de imprensa sobre a operação Turko, da Polícia Federal

A SaferNet se autointitula “Central Nacional de Denúncias” e mantém o site Denunciar.org.br, no qual o internauta pode comunicar a existência de páginas de internet criminosas. Com a parceria, as denúncias de crimes na internet seriam todas enviadas à SaferNet, que depois realizaria o encaminhamento para a autoridade competente. Com o fim da cooperação, a procuradoria de São Paulo pede que denúncias não-relacionadas ao Orkut devem ser feitas diretamente no site do MPF-SP pelo sistema de Digi-denúncia.

A ONG ganhou notoriedade por sua cruzada contra a pedofilia no Orkut, que culminou na assinatura de um termo de cooperação (“TAC”) que obrigou operadoras e provedores a adotarem medidas da polêmica Lei Azeredo mesmo antes de a lei ser aprovada. Thiago Tavares, presidente da SaferNet, é assessor na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pedofilia no Senado Federal, autora desse acordo.

Outro resultado da CPI foi a Lei da Pedofilia que, entre seus artigos, possui uma exceção para “membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas finalidades institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de notícia dos crimes”. A única entidade desse tipo no Brasil é a SaferNet, o que levou alguns juristas a considerarem a possibilidade de a organização estar legislando em causa própria.

No TAC de combate à pedofilia, foi estabelecido que cabe à SaferNet apenas receber as denúncias enviadas pelos internautas para repassá-las, imediatamente, ao Google, que ficou responsável por realizar a análise humana nas denúncias e dar o devido encaminhamento às autoridades. Porém, entre as denúncias que a própria SaferNet deveria verificar (não relacionadas ao Orkut), o parecer do MPF-SP concluiu que apenas 26,7% delas – menos de 1/3 – foram analisadas e encaminhadas.

Além das denúncias que não receberam análise, parte daquelas que receberam ainda foi tratada incorretamente. Segundo o parecer, por exemplo, “das 671 URLs reportadas [em 2010] para a CPI da Pedofilia, apenas 233 referem-se ao crime de pornografia infantil”. Do total de 9.174 URLs denunciadas à CPI, internautas haviam marcado apenas 46,6% como contendo pedofilia.

Da média de 71 links não relacionados ao Orkut que a SaferNet recebe por dia, apenas 5,3 são encaminhados, de acordo com a nota do MPF-SP. O órgão ainda afirma que recebeu apenas uma notícia-crime da SaferNet neste ano, apesar do montante de 13.650 URLs denunciadas por internautas.

De acordo com a conclusão do parecer, a capacidade de análise humana da “Central Nacional de Denúncias” está 14 vezes abaixo do ideal. O documento ainda reclama de inconsistências nos números e datas fornecidos pela SaferNet e do não-atendimento de solicitações do MPF-SP para a criação de recursos no sistema usado pela ONG (chamado de Report System).

Material relacionado ao Orkut compõe 97,5% do que é recebido pela SaferNet. O papel da ONG nessas denúncias é apenas de intermediária e não é realizada nenhuma verificação manual. Todo o processo é automático.

A organização, que tem ainda parceria com procuradorias do MPF em outros estados, não se pronunciou sobre o parecer do MPF-SP.

Ex-diretor é consultor do MPF-SP

Tiago Bortoletto Vaz, ex-diretor de tecnologia da SaferNet, assina o parecer crítico da ONG como consultor do Núcleo Técnico de Combate aos Crimes Cibernéticos (NTCCC), integrante da procuradoria do MPF em São Paulo.

Vaz era diretor da ONG em 2008 e, dois anos depois, publicou um post em seu blog falando sobre a insistência do Google – que na ocasião estava sob forte pressão da CPI da Pedofilia – em tê-lo como funcionário da empresa. Vaz afirma não ser “dotado das habilidades específicas que vocês [do Google] esperam”. “Não tenho nenhuma certificação (e nem pretendo permitir que ninguém me certifique de nada)”, escreveu ele.

Mesmo assim, depois deixar a SaferNet, Vaz assinou com o MPF-SP um contrato de consultoria técnica no valor de R$ 158.400,00, ou R$ 12.180,00 por mês (considerando doze meses mais décimo terceiro) na modalidade de “inexigibilidade de licitação” — quando o órgão público considera que não há necessidade ou possibilidade de abrir concorrência pelo serviço e contrata diretamente, sem a possibilidade de outra pessoa oferecer realizar o trabalho por um valor inferior.

Editado para corrigir o nome de Tiago Bortoletto Vaz e sua data de saída da SaferNet

Escrito por Altieres Rohr

Editor da Linha Defensiva.

1 comentário

  1. Capacidade pra fazer o sistema da safernet funcionar não tem…. Pra arrumar uma boca sem licitação com o mp tem…. Que barbaridade…
    É o mesmo que contratar o ex diretor de um banco falido pra ser assessor do banco central… Aff… Brasil…

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